sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

Conflito


Por Germano Xavier

eu vi a mão rosa
nos candelabros

a fatalidade do verde
inscrito em mim

vivo o bastante
a viver-me

para que eu não morresse
na dúvida de viver

ou morrer de dúvida
ao nascer

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

Mar do peito


Por Germano Xavier

Para Natália Macedo,
neste dia 12 tão nosso.


águas de sal do mar,
águas de só, de sol,
botam roxos para irem embora.
em boa hora vão-se
os vãos nos desvãos, pelas mãos – o mundo -
dos mundos,
e nos fundos humanos
do homem, somem homens,
o homem implorando perdão.

dessa água deságua
minha dor vivida,
nossos lastros impedidos
de dizer os nãos nem tão límpidos,
em talvez brancos estes sins malditos.

de fronte a ti, ó mar,
rogo meus erros às tuas ondas
para que não morra em monte
em mim a brusca vontade de (a)mar.


São Luís, Maranhão, agosto de 2011.

terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

O tempo da gíria


Por Germano Xavier

Em maior ou menor grau, toda gíria é – ou pretende ser – a expressão máxima de um determinado grupo que se utiliza da linguagem verbal para efetuar fenômenos comunicativos. Expressão máxima porque é ela que assegura os limites de uma privacidade de compreensão em quesitos tidos como passíveis de sigilo ou segredação tribal. É natural à gíria o seu poder de guardar ou proteger um desejo por diferença. As expressões giriáticas, dentro do contexto maior da linguagem, buscam a todo instante a sedimentação tanto de uma marca lingüística pormenorizada – e ao mesmo tempo evoluída - quanto de um sentido que, sendo ele lógico ou ilógico, possua o poder de dar significado a algo ou a alguma ação humana, verbalizada ou verbalizável. Esta incessante procura em definir o que é particular a uma tribo social, como num processo de demarcação de uma dada territorialidade expressa através da palavra e suas ramificações, ocorre em sua quase total generalidade na esfera do coloquial. Por sua vez, a coloquialidade inerente à gíria traça para si mesma um perfil estritamente popular. Debutante que é ao que se apresenta como sendo de ordem cotidiana, e desprovida de uma armadura lingüística mais forte capaz de lhe oferecer a necessária proteção ao desgaste natural que o fator tempo impõe a tudo e a todos, a gíria tem entre suas maiores e mais visíveis características a efemeridade. Por nascer e morrer assim, tão aligeiradamente, no falar do povo, a gíria alcança o ápice de sua condição muito rapidamente. É quando o seu sentido extrapola o seu domínio inicial, vaza pelas brenhas de sua própria espacialidade, adentra outros universos, agride outros, prolifera-se na multidão, e termina por perder muito de suas particularidades e possibilidades. De todo modo, mesmo após sua morte, a gíria sobrevive – as mais contundentes, diga-se de passagem -, tal qual uma alma penada, agora funcionando como um registro de um tempo passante, passageiro, passado. Nelly Carvalho, professora da UFPE, em artigo publicado em periódico pernambucano, diz que: “A efemeridade da gíria toca nossa sensibilidade porque demonstra concretamente a passagem do tempo, dos fatos, dos homens, enfim, põe em relevo a fugacidade e a vida”. Não basta que usemos a expressão giriática a torto e a direito, é preciso conhecer o seu funcionamento, a sua situação dentro do contexto linguístico, a sua operacionalidade, a sua serventia. Deste modo, além de nos transformarmos em seres atuantes e participativos dentro de nossa língua, propendemos a melhor nos entendermos como seres em progressiva atualização, ao mesmo tempo individuais e coletivos, descartáveis como uma gíria de verão, eternos como uma gíria dicionarizada.